segunda-feira, 2 de maio de 2011

[Continuação parte 2...] O período caótico

Os brasileiros escreveram em sua bandeira o lema positivista “Ordem e Progresso” . Esta palavra de ordem tem um outro sentido, o de um modelo mecânico aplicado à história. A idéia é a de um crescimento nacional, ordenado e inexorável, um aperfeiçoamento constante, uma marcha regular para cima e para melhor.
A história brasileira pode ser considerada como a tentativa da elite de manter o controle da sociedade através da idéia de ordem, à custa de uma altíssima dose de repressão e violência. A idéia de “ordem”, identificada com a “paz social”, isto é, com o controle incontestável das elites, se necessário, com o uso corriqueiro da violência direta, é eficaz para a explicação da história e da cultura política brasileiras. É a síntese de uma ideologia política, mas mais do que isto, um modelo mecânico aplicado por um grupo que detém o poder sobre uma sociedade. A evidência de sua eficácia é a sempre lembrada suposta “estabilidade política” do País, quando contrastada com as nações da América espanhola.
Por outro lado, a idéia de progresso levada à prática também seria confirmada pela história do País. Até os finais da década de 70, o Brasil teria sido um país com uma das maiores taxas de crescimento do PIB, talvez a mais alta, por um período contínuo de cerca de 100 anos.
O controle da elite sobre a sociedade era possível pelas condições de equilíbrio desta última, ou seja, a sociedade também ser organizava a partir de um modelo mecânico, de um modelo de equilíbrio que se reproduzia ao longo do tempo.
Este modelo surgia de uma forma tradicional de organização caracterizada por grupos oligárquicos organizados a partir de idéias familísticas, possuidores de grandes extensões de terra que construíam uma comunidade política unificadora de suas regiões. A articulação entre essas oligarquias regionais era a condição para a unidade política do Brasil. Já a massa pobre da população se vinculava a esses grupos patronais-oligárquicos, através de laços do tipo “compadrio” e, por seu intermédio, com a sociedade política, como um todo. A lealdade pessoal, como um aspecto central do código de honra das pessoas consistia no laço cimentando tanto a relação interna aos grupos oligárquicos, como a da população subordinada a esses grupos.
A melhor descrição deste sistema - através, também, de um modelo mecânico - ainda é encontrada em Oliveira Vianna quando identifica diferentes tipos de “clãs” no sistema político brasileiro do começo do século: o "Clã de feudo" reunindo o fazendeiro, sua família e seus agregados. As famílias relacionadas da oligarquia local criam o "Clã parental", as “camadas inferiores não têm solidariedade de classe nem parental." Participam, como um todo do “clã eleitoral” , que congrega vários clãs parentais, que trazem de arrasto seus peões e agregados. A sociedade se constrói por relações pessoais de lealdade.
O processo de abandono de um modelo mecânico de direcionamento da história pela elite, corresponde ao próprio processo de transformação da sociedade em que a elite tradicional vai deixando de existir. A sociedade torna-se incapaz de produzir uma elite comprometida com uma comunidade construída localmente. Na medida em que a sociedade vai entrando em um estágio caótico, o mesmo acontece com a elite e com sua capacidade ou sua ilusão de controlar o destino da história do País.
A quebra do sistema político tradicional brasileiro passa pelo crescimento econômico e pela urbanização recentes, com acentuadas características de concentração urbana da população, concentração industrial no Centro-Sul e crescimento acelerado da classe média. Corre paralelamente ao processo de descomprometimento da elite com o destino nacional. Este último movimento tem dois aspectos.
O primeiro é a substituição da lealdade com os velhos clãs descritos por Oliveira Vianna por outras comunidades políticas. Devido ao treinamento em larga escala, especialmente nos Estados Unidos, e ao trabalho no exterior, setores importantes no interior da elite passam a dedicar sua lealdade a comunidades concretas situadas fora do País.
O segundo é a ideologia que legitima essa mudança de lealdade para essa nova comunidade política construída a partir de universidades, instituições internacionais e empresas multinacionais: o conceito de nação perde para as elites seu valor simbólico e afetivo. É substituído pelos conceitos de mercado de mercado econômico e “modernidade”.
2 – A Impossibilidade/possibilidade de explicação
A existência da situação caótica é claramente percebida por todos no Brasil.
O senso de responsabilidade aristocrático/ patrimonialista da elite, quanto ao país e ao povo, desapareceu depois de 20 anos de governo militar. O mesmo aconteceu ao conjunto de relacionamentos pessoais anterior, que incluiu grande sistema político brasileiro tradicional. laços de lealdade estavam sendo rompidos em todo lugar com exceção daqueles no interior dos pequenos grupos de tipo familiar que ainda representam forma básica de organização na sociedade brasileira.
Desde a crise econômica dos anos oitenta, o país tornou-se uma arena para lutas ferozes entre grupos dentro de cada uma das suas instituições. Os grupos lutam para manter suas posições numa conjuntura onde as oportunidades são cada vez menores. O colapso de lealdade interclasse torna o país um campo de batalha, de uma guerra civil não declarada, não política, mas de maneira nenhuma não violenta O velho problema político brasileiro de disparidades regionais agrava-se pela concentração cada vez maior de riqueza no sudeste e pelo colapso dos arranjos oligárquicos. Nos termos de Henry Maine, o princípio organizacional do status vai aos poucos desaparecendo, mas não é substituído pelo contrato. Triunfa a aleatoriedade, o Brasil passa a ser percebido como uma arena onde o destino é decidido pela sorte e pelo azar, em substituição ao progresso ordenado para um futuro luminoso. O Brasil, portanto, entrou em um período caótico de sua história
Os brasileiros perplexos com a situação se perguntam Por que é que o Brasil entrou neste período da sua história? Ninguém tem certeza da resposta, mas diversas hipóteses correm o País, como por exemplo:
1. Deus abandonou o Brasil contrariando a expressão tradicional que diz que "Deus é brasileiro";
2. Os militares "roubaram a história brasileira", isto é, tiraram-na do seu curso natural;
3. Inflação causada por diversas razões e recentemente as fórmulas encontradas para o seu controle.
4. Concentração excessiva da renda;
5. Dívida externa;
6. O povo é preguiçoso, não trabalha bastante;
7. Conspiração conduzida pela CIA;
8. Crescimento excessivo da população;
9. Elevados níveis de analfabetismo;
10. Políticos corruptos, especialmente o presidente e seus ministros.
11.Políticos corruptos, especialmente os Deputados e Senadores.
12. Fundo Monetário Internacional associado a banqueiros brasileiros;
13. Economistas no governo;
14. A falta de moral do povo: os brasileiros perderam a vergonha;
15. Mudanças culturais excessivamente rápidas;
16. Os brasileiros são manipulados pela mídia e não sabem votar;
17 O "jeitinho brasileiro": o modo brasileiro de contornar todas as regras;
18. Os brasileiros tentam tirar vantagem de tudo;
19. Investimento no mercado financeiro, desviando o investimento em atividades produtivas;
20. Os brasileiros perderam os valores religiosos;
21.A cidadania não está bem estabelecida depois de décadas de ditadura;
22. O sistema judiciário não opera bem;
23. Oligopólios em toda parte;
24. O Presidente da República (Collor) era viciado em cocaína ;
25. O Presidente da República (Collor) era doente mental;
26. O Presidente da República (Fernando Henrique) está destruindo o estado e, por conseguinte, a nação.
27. Déficit público causado por um excesso de empregos públicos, vantagens previdenciárias e ineficiência do governo;
28. O programa de privatização das empresas estatais não está indo tão rápido quanto deveria;
29. O programa de privatização das empresas estatais está indo rápido em demasia e em amplitude demasiada.
30. O carnaval. Os brasileiros preferem dançar, beber e fazer sexo e não levam nada a sério;
31. O modelo de industrialização por substituição de importações chegou ao seu limite;
32. A colonização portuguesa que constrói sociedades onde a preguiça substitui o trabalho árduo.
Esta lista poderia ser estendida ad infinitum. É por si só um testemunho da desordem que reina no país. Não só refletem como contribuem para a desordem.


[Continua...]

George Zarur.Sorte e Azar, Verde e Amarelo:modelos matemáticos de imprevisibilidade aplicados a cultura humana Disponível em:<http://www.georgezarur.com.br/artigos/116/sorte-e-azar-verde-e-amarelo-modelos-matematicos-de-imprevisibilidade-aplicados-a-cultura-humana>. Acesso em 20/04/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário